Contemplava a arquitetura da cidade tentando assimilar á algo bom. Nenhum sucesso era para mim desprezível. Ora, pois meu dia estava um fracasso deprimente de ilusão onde o pobre coração partido, as bochechas umedecias e frias como águas mortas, do olho cansado e marejado e a voz calma, fraca e seca que mais era meiga e pura. Achando que o melhor remédio para essa forte dor que sentia atravessar meu peito feito laminas de prata seria afogar-me entre pessoas desconhecidas e prédios sem vida baseados na arquitetura moderna e futurística fugi do cotidiano e ingressei num mundo distante e desconhecido no qual pensei em ficar.
De pé ao relento tentava entender alguma coisa que se passava naquele lugar, poderia jurar de pés juntos que era noite de tão escuro que era o manto que cobria de fora a fora o céu. Não era negro, mas não poderia dizer que era cinza, mentiria se o disseste. Era calmo porem sombrio. Uma força extra ordinária me empurrava e eu lutava com gritos inaudíveis fora de mim, uma chuva de cacos estilhaçados que parecia vidro era soprada contra mim. Uma chuva seca que vinha de baixo e tomava conta de todo meu corpo. Eu corria sem sucesso, ela era mais rápida do que era possível ser.
Senti dentro de mim uma espécie de engrenagem que girava e pulava saindo pela tangente e ricocheteando nas paredes de meu estômago. Suas pontas mais pareciam navalhas que me cortavam sem dó nem piedade. Não conseguia mais correr muito menos andar. Pude imaginar a figura de uma criança, bem bonita até, sentada sobre uma cadeira muito grande com vestes brancas muito maiores que seu corpo, suas mãos escondidas dentro de mangas compridas e largas rindo, gargalhando e gritando meu nome pedindo bis. Essa criança era Deus.
Quis chorar, chorei sem lágrimas, não havia força em mim para este ato tão banal e artístico. Ninguém vai aplaudir – disse uma voz dentro de mim.
Tinha vergonha dos olhos sobre mim. Uma bigorna de culpa caiu sobre minha cabeça e lembranças assombrosas vieram a mim como um tornado que leva tudo quando passa. Trouxe consigo dor. Abria e fechava meus olhos, tampava os ouvidos e pedia piedade de quem fosse o dono da culpa.
- Sinto dor – disse – esta dentro de mim e não sei o que é. Por toda parte sinto espinhos dançando. – Ninguém me entende.
Acendi meu dunhill que queimou tudo que havia dentro de mim, mas não alcançou meu ouvido que repetiam as mesmas palavras da noite passada, um locutor irónico em minha cabeça gargalhava contra mim. Minha língua sentia amargos gostos de doce. Todas as doenças se manifestavam
Já desistira de descansar e foi quando Hypnos me nocauteou. Sonhei com o mesmo questionamento de sempre - as coisas vão melhorar?
Trecho retirado da contra-capa do livro Ostra feliz não faz pérola, escrito por Rubem Alves em 2008:
ResponderExcluir"A ostra, para fazer uma pérola, precisa ter dentro de si um grão de areia que a faça sofrer. Sofrendo, a ostra diz para si mesma: 'Preciso envolver essa areia pontuda que me machuca com uma esfera lisa que lhe tira as pontas...' Ostras felizes não fazem pérolas... Pessoas felizes não sentem necessidade de criar."
Este texto é tão bonito e esférico como uma pérola que um dia machucou uma ostra.
Realmente é um texto muito bom. Me tocou de uma forma especial. Parabéns Matt.
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