12 dezembro 2011

Perdição


Aqueles murmúrios de amor do quarto ao lado me incomodavam tanto que mesmo entrando de cabeça no relato de Nuria Monfort sobre o desaparecimento de Julian Carax e suas obras queimadas não fui capaz de me concentrar. Eu estava a algum tempo sofrendo daquele que todos conhecem bem e não precisa ser citado aqui e agora. Eu fui deixado no quarto sozinho depois que alguns de meus colegas partiram de ódio. Esqueci as janelas abertas. Lá do meu quanto, no andar mais alto da casa de frente para os céus pintados de azul marinho e com pinceladas de branco ou cinza acabei adormecendo com aqueles sonhos que mais me pareciam pesadelos agora.
Eu dormia sóbrio dos sofrimentos e mesmo que inconsciente descansava sabendo o que o próximo dia me aguardava. Quando o despertador me alertou que o dia me começava abri meus olhos de bom grado. Não havia sono e tampouco mal estar. Contudo fiquei ali deitado de olhos fechados por aproximadamente vinte minutos. Quando retomei a postura de ser me levantei da cama tomado por um branco fantasmagórico que vinha das janelas que dormiram abertas comigo. Naquela madrugada eu havia, varias vezes, acordado e as olhado atento por segundo antes de ser tomado pelo sono novamente.
Toquei a janela com os olhos e vi a cidade tomada pelos fantasmas que se sentiam a vontade deitados sobre os telhados de barro que carregavam uma historia pesada.  Eles se moviam como fumaça e não se importavam se eu estivesse olhando-os nos olhos. Diziam-me algo em silêncio como se sentissem a minha dor somente no olhar. E ali ficaram leves sobre a cidade adormecida que tomava os primeiros raios de luz de um sol escondido por de trás das nuvens grandes e assustadoras.
Despi-me defronte um espelho grande. Onde pude ver mais que algumas costelas sobressalentes na minha pele. Nos meus olhos encontrei um eu acusador que me fuzilava com perguntas que eu sabia que escutaria em algum lugar, mais cedo ou mais tarde. 
“Porque você achou que ele estaria contigo criatura? O que passou pela sua cabeça levando a pensar que ele veria algo de bom nisso aqui? Onde foi que você aprendeu a mentir para si mesmo a ponto de acreditar que vocês poderiam estar juntos?”
Escutei cada palavra do meu reflexo parado. Enquanto eu segurava meus punhos de medo e vergonha. A pele das maças de meu rosto tremia e minha visão foi se perdendo. Eu não notava a força que fazia para não chorar e ao mesmo tempo encarar meus olhos no reflexo. O brilho foi se perdendo e a minha visão se embaçando enquanto as lagrimas se formavam em meus olhos. Abri a boca e um longo suspiro desabrochou meu corpo. Diminui alguns centímetros quando me fechei com vergonha de mim mesmo. Ou dele, aquele garoto que eu havia visto a minha frente alguns segundos atrás. Aquela criança mais ou menos feia. Mais ou menos razoável.
Eu passava pelas fases do sofrimento tão rápido que debaixo da água quente daquela manha eu passei a pensar que algo em mim mudava com o tempo. A cada vez que acontecia eu superava mais rápido e a cada vez eu tinha menos reações. Chorava sem lagrimas ou sussurros. Sofria sem palavras. Sofria de bom grado e com aceitação. Havia algum tempo que eu aceitara em fim que aquele meu criador me impediu de ser amado. E me brotou um amor brutal. O qual me come por dentro. Corroendo tudo o que vê pela frente. E eu sinto que meu coração esta esfriando. À medida que a paixão me queima. Sinto que a cada dia perco um pouco do meu romance. Estou morrendo.
Márcio Mattos

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